domingo, 28 de fevereiro de 2010

Louis Vuitton

Um dos primeiros posts deste blog foi a propósito da maravilhosa fortografia que Leibovitz tirou a Baryshnikov. Não podia, assim, passar despercebido o mais recente anúncio da Louis Vuitton que teve como pretexto convidar Leibovitz para ser imagem da marca, de forma a ajudá-la na complicada situação financeira em que se encontra e que tão explorada tem sido pelos media.

A fotógrafa, lisonjeada pelo convite, pediu que a fotografia lhe fosse tirada com o seu amigo Baryshnikov, com o resultado que se vê:


Se a marca esteve muito bem no convite que fez, a imagem é interessantíssima, imortalizando a artista a contemplar o outro artista no seu pedestal. De notar o livro que sai da mala Vuitton à qual se encosta Leibovitz e que se intitula Dance and Photography.

Link para a reportagem sobre o making of da fotografia:
E porque nem só de dança vive o homem... mais duas curiosidades acerca da marca:

(1) Victor Borges é português e é o mais recente director de projectos da marca.

(2) Eis o modelito da mais recente colecção que estaria muito melhor no meu armário do que numa qualquer prateleira impessoal:

Ah! e coitaditos destes também...


sexta-feira, 26 de fevereiro de 2010

P-Â-N-I-C-O ou nem tanto

Estou ansiosa para ver este filme e parecer uma tontinha a fazer o pino no cinema para não olhar para o écran. É o costume. Mas invariavelmente vejo filmes de terror, absolutamente limitativos e limitadores e passo todo o tempo a dizer a mim mesma que é só um filme, enquanto olho para a imagem por entre os dedos das mãos.

Um horror.

Mas imperdível!

...

Desengane-se quem vai em busca de um filme de terror. E a culpa é do autor do trailer que constrói 5minutos de se lhe tirar o chapéu capazes de atrair todos os tipos de público. Trata-se de um excelente filme, mas por motivos diferentes dos que nos levam a ir vê-lo.

Shutter Island é um filme de suspense, mas é acima de tudo um drama psicológico muito intenso em que o espectador é levado a crer nas aparências, para depois se aperceber de que o trompe l´oeil era gigantesco. Théâtre dans le théâtre e mais não digo.

DiCaprio está absolutamente à altura da profundidade da sua personagem, sendo capaz de levar o espectador a ver através dos seus olhos, numa interpretação no mínimo perturbadora.

Scorcese constrói uma história com uma excelente escolha de autores, uma mistura de filme negro, de suspense e de terror, usando uma banda sonora perfeitamente adequada e cenários que apelam ao imáginário comum: um manicómio-prisão onde se escondem os mais loucos e perigosos criminosos. Muito bem construída está a mistura entre o sonho e a realidade, entre a embriaguez e a sobriedade.

Um filme a ver quanto antes, por todos os motivos.

quinta-feira, 25 de fevereiro de 2010

Esplanada da Graça




Grande spot! Faz-me lembrar uma imperial gelada ao final da tarde de um dia de calor...

quarta-feira, 24 de fevereiro de 2010

Margot e Nureyev




Genial.


Trata-se de um momento do Lago dos Cisnes, com música de Tchaikovsky, interpretado por Rudolf Nureyev e Margot Fonteyn, no qual ambos fazem um incontável número de perfeitas pirouettes fouettées. Precisam de apresentações?


Nureyev (1938-1993) foi o maior bailarino de todos os tempos: nascido na Rússia, estudou na Academia Vaganova (Kirov) de acordo com a fortíssima técnica russa, tendo pedido asilo aquando de uma tournée em Paris. É o começo de uma carreira que faria de um bailarino clássico uma verdadeira estrela pop. Se a técnica ensinada no Kirov não primava pela expressão das emoções, Nureyev encontrá-la-á com Margot Fonteyn (1919-1991), a melhor bailarina inglesa da altura, 20 anos mais velha e já muito conceituada - 1ª bailarina do Royal Ballet.

Constrói-se, assim, a mais conhecida parceria do mundo da dança clássica, com dois bailarinos exímios que se completam, apesar da enorme diferença de idades entre ambos. Se Nureyev trouxe a perfeição da técnica, Margot F. ensinou-lhe a emoção da dança e uma gestualidade que, na Rússia, não existia. Criou-se, entre ambos, e acima de tudo, uma electricidade que entusiasmava multidões desde o primeiro momento.

Não tenho conhecimento de alguma vez mais se ter repetido a sinestesia provocada por Margot e Nureyev.

segunda-feira, 22 de fevereiro de 2010

Whatever works!

Woody Allen no seu melhor! Whatever works torna-se uma espécie de lema de vida.

Gostas desta saia? Ou preferes aquela? Whatever works.

Azul ou verde? Whatever works.

Cilit Bang ou Cif? Whatever works.

Frito ou grelhado? Whatever works.

Whatever works, bolas... as long as it works, claro!

quinta-feira, 18 de fevereiro de 2010

De Brel, Barbara e Bejart

"Ne me quitte pas" de Jacques Brel, com coreografia de Maurice Béjart para o espectáculo "Brel et Barbara".

A música é original de 1959 e o espectáculo de 2001, tendo surgido da ideia de juntar a música de Barbara (amiga do coreógrafo) à de Brel que Béjart também conheceu.

O casamento é sublime. A bailarina Elisabet Ros tem aqui uma interpretação impressionante. Se tecnicamente é óptima, a sua interpretação é igualmente especial. A semelhança física com Barbara é quase atroz.

Béjart é mestre na desconstrução do ballet clássico sem que este se perca (nota-se a fortíssima base clássica das suas coreografias). Detesto coreografias contemporâneas de pessoas aos gritos a correr de um lado para o outro: não vejo qualquer beleza na total alienação do que são as normas de leveza e equilíbrio.

Em Béjart encontro uma expressividade que o ballet não permite. A estranheza nunca se instala e essa é a mestria suprema.

Bar Foxtrot em Lisboa



Bar muito trendy ao pé da Praça das Flores, muito no estilo do Pavilhão Chinês, mas em mais cosy. Talvez um dos melhores sítios de Lisboa para pôr a conversa em dia.

http://www.foxtrot-clubsupremo.com/fox/index.php?option=com_content&view=frontpage&Itemid=1

quarta-feira, 17 de fevereiro de 2010

Da Tosca e da Callas



Hoje apeteceu-me ouvir o "Vissi d´arte". O da Callas, claro.

É terrível. Quando se começa pelas maiores, pelos maiores, depois é quase impossível descer à terra. Com isto não quero dizer que não haja outros cantores muito bons, mas parece que o género se identifica à pessoa. Nada a fazer.

"Vissi d´arte" é área mais conhecida da "Tosca" de Puccini. Trata-se, para mim, da mais impressionante prestação da Callas. E basta ouvir para perceber exactamente porquê.



Maria Callas foi a soprano mais conhecida de sempre quer pela sua capacidade vocal (mais pela amplitude do que pela pureza do timbre) quer sobretudo pela sua incrível capacidade interpretativa.

Aqui, numa tragédia (verdadeiramente trágica - com mortes, paixões avassaladoras e ciúmes do antigamente), Callas consegue realmente mostrar como se chora, ri, pensa e respira apenas com a voz.

domingo, 14 de fevereiro de 2010

Enquadramento e composição



Numa viagem a África, um amigo conheceu uma fotógrafa americana - Tai Power Seeff - que vale mesmo muito a pena acompanhar. Muito original nas composições que faz, é realmente um prazer visitar o seu site.

http://www.taipowerseeff.com/

sábado, 13 de fevereiro de 2010

De Duras


Volta-se sempre ao que se gosta. A verdade é essa. Podemos fingir ou pretender gostar de outras coisas, mas a sensibilidade não muda. Duras é genial: regresso, anos depois, aos seus livros, e a conclusão é sempre a mesma.

Trata-se de uma escritora primordial, na medida em que é capaz de escrever o que parece demasiado simples mas que ninguém antes escrevera. Foi imitada e é imitada até aos dias de hoje nas suas frases simples, nas frases com apenas uma palavra, nas repetições. Excelente narração da corrente do pensamento. Sou muito mais partidária duma corrente transcrita pelo resumo do que da construção de textos que considero bons mas quase ilegíveis, como o Ulisses, de Joyce.

(sim, é verdade, pode ser uma obra-prima mas não consigo lê-la até ao fim)

Duras tornou-se igualmente personagem: artista decadente, alcoólica, doente, doente da doença e doente da escrita, profundamente obcecada com a questão do eu. A importância da Indochina na sua obra revelou-se vital, como no inesquecível L´amant (Prix Goncourt). No final ela é, sem pudores, a sua personagem: Écrire, Yann André Steiner, Le monde extérieur, C´est tout. Ela e Yann, o admirador que conhece na projecção de um filme e a cuja carta responde anos depois, envolvendo-se num romance que transcreve obsessivamente na sua obra.

Sente-se no final que Duras se tona prisioneira do seu perfeccionismo e da procura da palavra perfeita. Écrire marcou-me especialmente:

Se trouver dans un trou, au fond d´un trou, dans une solitude quasi totale et découvrir que seule l´écriture vous sauvera.
[Estar num buraco, no fundo dum buraco, numa solidão quase total e descobrir que apenas a escrita será salvação.]

L´écriture c´est l´inconnu. Avant d´écrire on ne sait rien de ce qu´on va écrire. Et en toute lucidité.
[A escrita é o desconhecido. Antes de escrever não sabemos nada do que vamos escrever. Com toda a lucidez.]

C´est curieux un écrivain. C´est une contradiction et aussi un non-sens. Écrire c´est ne pas parler. C´est se taire. C´est hurler sans bruit.
[É curioso, um escritor. É uma contradição e também um não-sentido. Escrever é não falar. É ficar calado. É gritar sem barulho.]

*Traduções muito livres.

sexta-feira, 12 de fevereiro de 2010

World Press Photo



Pietro Masturzo, fotógrafo italiano, ganhou o world press photo deste ano com esta fotografia que retrata uma mulher aquando dos protestos contra a reeleição do presidente iraniano.

Não gosto da imagem. Acho-a especialmente trabalhada. Creio que uma significativa parte do seu valor é atribuído pelo momento actual, muito mais do que pela beleza da imagem em si.

Maravilhosa é a imagem que gahou o 2º prémio na categoria de natureza, da autoria de Nick Cobbing.

quinta-feira, 11 de fevereiro de 2010

Completamente Out of Africa



Jamais em tempo algum eu poderia escrever onde quer que fosse sem incluir uma linha sobre este filme. Se agora disser espectacular, vai parecer piroso; maravilhoso também; fantástico é um pouco oco, fenomenal parece adjectivo para filmes de ficção científica... fica sublime.

É que tudo no filme é mesmo muito bom. A música, a fotografia em cores quentes, o ritmo, o guião. Nunca África tinha sido tão central como neste filme. Faz quase pensar na literatura francesa do século XIX sobre a cidade: cidade-personagem que se impõe ao lado dos actores.

E depois a voz da Meryl Streep

"once i had a farm in Africa"

e a cena em que ela guarda os livros, sentada no chão, para descobrir que ele morreu. Não deixa de ser uma interpretação profundamente contida, a de todo o filme, e por isso mesmo mais emotiva, por dar espaço à interpretação.

(todas as histórias de amor são ridículas)

As imagens dos quicuio na escola. Todo o projecto do café. E o fogo. Já para não falar da própria Karen, dinamarquesa perdida em África, num continente que nos aparece tanto maior quanto a imensidão das filmagens verticais com terra a perder de vista. É impossível esquecer a tensão dramática dos serões a contar histórias - renovada noção das noites sem televisão.

Filme sobre a noção de liberdade. Disputa entre dois seres profundamente livres que no entanto se apaixonam - o amor não sabe não pedir nada em troca.

E depois existe o Robert Redford, actor que não consigo comentar sem um sorriso nos lábios e uma certa condescendência perante a minha própria parcialidade. É que ele não sabe, mas durante muitos anos achei mesmo que ele me tinha lavado o cabelo na margem de um qualquer rio no Quénia.

Pois!

Uma vez conheci uma pessoa que estava a fazer um doutoramento sobre a palavra "pois". Resolvi assim lançar-me o desafio de ver até onde conseguia ir sobre este tema que tanto me intriga por exactamente não ter praticamente nada a dizer que não me ponha a mim própria a dormir. Lanço o mesmo desafio aos meus leitores.

Um doutoramento?! Páginas e páginas de pois, pois, pois.

Pois tem utilização em vários contextos, é verdade. Há o velho "ah pois é" quando nos exprimem uma opinião com a qual estamos de acordo, assumindo mesmo uma atitude condescendente (este ah pois é tem que ser dito com a cabeça inclinada de lado, com alguma superioridade face ao interlocutor).

Há também o "pois" que se repete freneticamente quando alguém está a contar uma história, com a cabeça desta vez a acenar verticalmente para cima e para baixo, numa espécie de tique nervoso de quem está a milhas do que lhe estão a contar.

Não esquecer o "ahpoijébébé" muito frequentemente utilizado pelas adolescentes do sexo feminino aquando de acesa conversação com as amigas, normalmente debatendo temas particularmente mundanos.

"Pois... não sei" - expressão de elevadíssimo poder contraditório. Primeiro confirma-se com o "pois", abrem-se mais os olhos em sinal de concordência, para finalmente se manifestar a mais profunda ignorância. Expressão tipicamente portuguesa, melhor definida como não sendo nem carne nem peixe.

Por fim "pois" é uma conjunção coordenativa conclusiva, sendo exactamente essa a função que nunca lhe atribuímos. Quem se imagina a exclamar:

- Não vás por aí POIS há uma poça?

quarta-feira, 10 de fevereiro de 2010

Do Jardin du Luxembourg



O Jardin du Luxembourg é um sítio incontornável em Paris.
Em primeiro lugar porque os espaços verdes adquirem uma importância muito maior em cidades sem mar, sendo os escapes dum dia de Primavera ou mesmo dum quente dia de Verão. Os jardins são, para Paris, uma especie de mar de Lisboa. E isso não é necessariamente limitador.

Quantas pessoas temos visto, em Lisboa, comprar uma sandes e andar o que for necessário até ao jardim mais próximo para se sentar debaixo duma árvore a almoçar? Quantas pessoas temos visto escolher o jardim da Estrela como poiso para uma tarde de calor? Contra mim falo, praticamente ninguém.

Ora em Paris os jardins servem para tudo isto e o Jardin do Luxembourg é o jardim por excelência. A existência de milhares de cobiçadas cadeiras à volta do lago central testemunha a utilização: é maravilhoso ver, num dia de sol, o jogo das cadeiras que inevitavelmente se constitui enquanto todos procuram, de livro debaixo do braço, um espaço para estar.

Em Paris, também eu passei tardes a ler no jardim. Em Paris, também eu comprei sandes, sozinha ou acompanhada, no quiosque do cruzamento do blv st michel com o blv st germain (formula 3€ panini + bebida) e trepei todo o boulevard até ao jardim, por ser muito mais agradável do que almoçar no asfalto. Em Lisboa não faço nada disto. É um pouco como o chapéu na moda que compramos de viagem e depois NUNCA usamos quando chegamos a casa. Em viagem somos diferentes. Em viagem usamos roupa mais avant-garde e um estilo de vida boémio e especial.

No Jardin du Luxembourg, com um livro de bolso comprado por 3€ em 2ª mão na Gibert acho que tudo fazia um bocado mais de sentido. E, no entanto, ansiava pelo mar.
Cá, tudo faz menos sentido, e anseia-se pela viagem.

terça-feira, 9 de fevereiro de 2010

Da fotografia de Baryshnikov por Annie Leibovitz



Não sou de todo expert em fotografia. Não conheço os termos técnicos ou os parâmetros sob os quais se deve avaliar uma imagem. Não deixo, no entanto, de achar que em literatura, pintura, fotografia, dança, música e afins um conhecimento demasiado técnico pode acabar por destruir o olhar puro perante a obra.
É evidente que não sou a primeira pessoa a analisar a questão da crítica e a da validade da mesma, mas tenho particular gozo em pôr-me perante formas de arte sob as quais não tenho a priori quaisquer termos pré-definidos.

Esta fotografia une dois artistas que aprecio particularmente: Baryshnikov e Annie Leibovitz. O primeiro pela forma magistral como dança, pela clareza da técnica, pela postura emotiva que põe nos movimentos, pela criatividade que incutiu à sua forma de viver a dança. Leibovitz pelo dramatismo da sua fotografia, pela impressão de fim de mundo que transmite, pela capacidade de criar fotografia "comercial" sem por isso perder a essência que a leva a disparar.

Leibovitz ousa aqui inverter os padrões estéticos pondo o bailarino a ser elevado por outro bailarino, ao contrário da imagem tão fortemente difundida da mulher, mais frágil, levantada por um homem. Baryshnikov é assim imortalizado numa posição que poderíamos considerar contra-natura frente a um dos elementos mais ilustrativos da Natureza: o mar. E se as convenções parecem ser invertidas, Baryshnikov não deixa de conseguir uma posição tecnicamente muito bonita - ficando, assim, na imagem como um artista capaz de interrogar a ordem sem por isso deixar de a atingir.

Sonata de Outono


Sonata de Outono é um filme magistral.

A dor torna-se por vezes quase insuportável. Como explicar a uma mulher que deve amar as suas filhas? Como fazer prevalecer laços que não existem ou que um mundo inteiro se empenhou em destruir?

Texto intemporal num filme que Ingmar Bergman torna igualmente intemporal: a luz, os planos, os diálogos, os silêncios, as lágrimas. O que faz uma mãe chorar ao ouvir a filha tocar piano senão a emoção ao descobrir talento numa mulher que repudiou? A impossibilidade de elogiar é profundamente cruel. Creio, no entanto, que o mais interessante será o jogo de amor-ódio que se amplifica com o avançar da trama. A profundidade da personagem da filha servil, os olhos atentos do marido que não deixa de incarnar uma espécie de voz da consciência do filme, os gritos aterradores da rapariga doente que só a irmã compreende. Fica aliás a dúvida se realmente compreende ou se finge compreender para magoar a mãe e lhe mostrar como tudo o que lhe devia ser familiar, lhe é na verdade alheio. E uma dor constante.

A mãe foge. E a filha ainda lhe escreve para pedir desculpa. Manobra desconfortável que deixa o espectador inquieto: a "vítima" suplica amor à "criminosa". E pede-lhe uma oportunidade mais para lhe mostrar que gosta dela.

Se a imagem de um círculo vicioso é inquietante, o filme de Ingmar B. e o olhar de Ingrid B. dão uma nova dimensão à palavra inquietude.

segunda-feira, 8 de fevereiro de 2010

Da carnação ebúrnea


"Entravam então no peristilo do Hotel Central - e nesse momento um coupé da Companhia, chegando a largo trote do lado da rua do Arsenal, veio estacar à porta.
Um esplêndido preto, já grisalho, de casaca e calção, correu logo à portinhola; de dentro um rapaz muito magro, de barba muito negra, passou-lhe para os braços uma deliciosa cadelinha escocesa, de pêlos esguedelhados, finos como seda e cor de prata; depois, apeando-se, indolente e poseur, ofereceu a mão a uma senhora alta, loira, com um meio véu muito apertado e muito escuro que realçava o esplendor da sua carnação ebúrnea. Craft e Carlos afastaram-se, ela passou diante deles, com um passo soberano de deusa, maravilhosamente bem feita, deixando atrás de si como uma claridade, um reflexo de cabelos de oiro e um aroma no ar. Trazia um casaco colante de veludo branco de Génova, e um momento sobre as lajes de peristilo brilhou o verniz das suas botinas. O rapaz ao lado, esticado num fato de xadrezinho inglês, abria negligentemente um telegrama; o preto seguia com a cadelinha nos braços. O preto seguia com a cadelinha nos braços. E no silêncio a voz de Craft murmurou:
- Très chic."

in Os Maias