sábado, 13 de fevereiro de 2010

De Duras


Volta-se sempre ao que se gosta. A verdade é essa. Podemos fingir ou pretender gostar de outras coisas, mas a sensibilidade não muda. Duras é genial: regresso, anos depois, aos seus livros, e a conclusão é sempre a mesma.

Trata-se de uma escritora primordial, na medida em que é capaz de escrever o que parece demasiado simples mas que ninguém antes escrevera. Foi imitada e é imitada até aos dias de hoje nas suas frases simples, nas frases com apenas uma palavra, nas repetições. Excelente narração da corrente do pensamento. Sou muito mais partidária duma corrente transcrita pelo resumo do que da construção de textos que considero bons mas quase ilegíveis, como o Ulisses, de Joyce.

(sim, é verdade, pode ser uma obra-prima mas não consigo lê-la até ao fim)

Duras tornou-se igualmente personagem: artista decadente, alcoólica, doente, doente da doença e doente da escrita, profundamente obcecada com a questão do eu. A importância da Indochina na sua obra revelou-se vital, como no inesquecível L´amant (Prix Goncourt). No final ela é, sem pudores, a sua personagem: Écrire, Yann André Steiner, Le monde extérieur, C´est tout. Ela e Yann, o admirador que conhece na projecção de um filme e a cuja carta responde anos depois, envolvendo-se num romance que transcreve obsessivamente na sua obra.

Sente-se no final que Duras se tona prisioneira do seu perfeccionismo e da procura da palavra perfeita. Écrire marcou-me especialmente:

Se trouver dans un trou, au fond d´un trou, dans une solitude quasi totale et découvrir que seule l´écriture vous sauvera.
[Estar num buraco, no fundo dum buraco, numa solidão quase total e descobrir que apenas a escrita será salvação.]

L´écriture c´est l´inconnu. Avant d´écrire on ne sait rien de ce qu´on va écrire. Et en toute lucidité.
[A escrita é o desconhecido. Antes de escrever não sabemos nada do que vamos escrever. Com toda a lucidez.]

C´est curieux un écrivain. C´est une contradiction et aussi un non-sens. Écrire c´est ne pas parler. C´est se taire. C´est hurler sans bruit.
[É curioso, um escritor. É uma contradição e também um não-sentido. Escrever é não falar. É ficar calado. É gritar sem barulho.]

*Traduções muito livres.

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